Este artigo pretende possibilitar um conhecimento mais profundo dos aspectos subjacentes ao assédio moral, cuja compreensão faz-se necessária para a conscientização de um investimento mássico em implantação de ações de sua prevenção.
O assédio moral é um psicologismo
pervertido que expõe traços patológicos da cultura empresarial, conseqüência
direta dos novos métodos de gerência em que prevalecem a competição deslavada,
o abuso de poder e a manipulação perversa das vítimas.
Segundo Almeida (2002, p.1-7), um dos
primeiros efeitos do assédio moral, que atinge diretamente a produtividade e
favorece o absenteísmo, é a redução da motivação e do nível de auto-estima do
empregado, por não ter espaço para criar e inovar.
Assim, trabalhadores tendem a
prejudicar-se e a própria empresa, na medida em que são vitimados pelas
conseqüências negativas de um sistema operacional ineficiente (YOKOYAMA, 2005,
p.22).
ASSEDIO MORAL
Com a globalização, importou-se uma
cultura individualista que prioriza os fatores econômicos em detrimento aos
fatores humanos, na qual procedimentos aviltantes e ofensivos à dignidade e
reputação do trabalhador como o desprezo, clima de terror, desprezo e
manipulação da comunicação e informação, tornam-se práticas institucionalizadas
na empresa, gerando a violência psicológica laboral e desencadeando o fenômeno
do assédio moral. Segundo Leymann (1996, p.35), este psico terrorismo é a
desqualificação gratuita que atinge o funcionário não apenas psicológica e emocional,
mas, também, fisicamente. Um assassinato lento que precisa ser punido, uma vez
que a infelicidade é num ralo financeiro concreto.
Assim, não obstante os avanços na área
tecnológica, houve um retrocesso na área social, como conseqüência da desvalorização
do trabalhador.
De acordo com Bitelli (2002, p.01) e
Figueiredo (2002, p.122), o assédio moral cria um ambiente desagradável
reduzindo a produtividade de todos. Atualmente, o trabalho tornou-se quase um
privilégio. Vivê-lo com sofrimento é um duplo desperdício e reduz a vida a um
drama no local de trabalho. Concordando, Yokoyama (2005, p.19-20) diz que:
Subestimado no potencial funcional e
intelectual, o funcionário sente-se frágil e desvalorizado e acaba sendo
ineficiente e inativo, comprometendo o seu desempenho profissional.
Desestabiliza-se a sua relação, pois, provavelmente, os demais funcionários
sentir-se-ão afetados de forma indireta pelas agressões. Cerceando-se, assim, o
exercício da criatividade, é natural que a produtividade seja reduzida e o
absenteísmo favorecido. [...] Criar condições mais harmônicas nas organizações
e resguardar a saúde física e mental do trabalhador são quesitos essenciais
dentro desta perspectiva. Porém, na prática, verifica-se que as manifestações
de assédio moral nas organizações crescem proporcionalmente ao aumento da
submissão coletiva construída e alicerçada no medo do desemprego.
Ademais, se a vítima do assédio tentar
buscar apoio, dificilmente conseguirá que alguém compartilhe a responsabilidade
como testemunha, pois, ou irão alegar desconhecimento dos detalhes ou irão
minimizar a importância do fato como se fosse uma distorção de percepção da
vítima (FREITAS, 2001, p.8-19). Houve uma banalização do termo assédio moral,
tornando-o uma ocorrência perfeitamente normal no cotidiano das organizações,
onde métodos de assédio estão constantemente mascarados em modernas técnicas de
recursos humanos.
De acordo com Yokoyama (2005, p.145), Ades
(1999, p.42) e Thomson (1997, p.73-80), mecanismos para dar à vítima do assédio
o direito de denunciar, como palestras, ações coletivas e campanhas de
mobilização, tornam-se inócuos frente a um problema que é estrutural e não
individual. Além disso, o senso do perigo de carência financeira para o
indivíduo e sua família e, também, de tempo de procura por outra posição,
sobrepuja veleidades de reação à moda antiga através de confronto direto com o
agressor. Do mesmo modo, Sotto Mayor (2004, p.01) diz:
Denunciar é a única forma de acabar com o
assédio. É preciso, porém muita coragem para fazê-lo e estar vivendo uma
situação-limite, pois tal denúncia significará muitas vezes uma ruptura
definitiva com a empresa. Há que se lembrar também que não existe a certeza da
acolhida por parte da empresa e que, mesmo que algum processo legal seja
desencadeado, muito dificilmente ele trará resultados favoráveis à vítima [...]
A única certeza que a vítima terá ao romper com o processo de assédio é que
[...] ela obterá sua vida de volta.
Todavia, Yokoyama (2005, p.40) alerta que,
devido ao custo econômico e social do assédio moral, as organizações precisam
conscientizar-se sobre a necessidade de se coibir comportamentos doentios,
frutos tanto de uma administração rígida, dominada pelo terror e pelo silêncio,
quanto da administração frouxa, insensível aos valores éticos e que tenta
administrar os problemas de desentendimento sem fazer nada e que dão azo ao
assédio moral.
Pode-se concluir que o assédio moral custa
caro para as vítimas porque precisam se tratar, as vezes perdem o emprego e
outras vezes precisam recorrer a um advogado para defender seus direitos. Este
custo também se estende à sociedade que arca com as despesas das pessoas que
ficam doentes e impedidas de trabalhar. Custa caro para as empresas devido ao
problema do absenteísmo associado à desmotivação e perda de produtividade, à
degradação do ambiente de trabalho e à deterioração de sua imagem pública. Ou
seja, todos perdem com o assédio moral (YOKOYAMA, 2005, p.77).
Nesse sentido, Soares (2001, p.102-109)
declara que, mesmo adoecido, o trabalhador continua trabalhando porque, mais do
que fonte de sobrevivência, na sociedade capitalista o trabalho constitui-se na
principal identidade do cidadão e é ele que define o seu lugar na sociedade.
Cabe salientar que o resultado da pesquisa realizada por Yokoyama (2005, p.112)
corrobora este parecer:
[...] o problema da empregabilidade é uma
inesgotável fonte de oportunidades para a prática do assédio moral. Ancorados
no medo dos empregados de perder o emprego, os empregadores adotam uma cultura
baseada na gestão tirânica desenvolvida ao longo de muitos anos, segundo
depoimento dos respondentes, e escravagista e, também, em paradigmas e
pressupostos obsoletos.
Ademais, Eichenberg (2002, p.14-15), Jesus
(2002, p.1-2), Soares (2001, p.102-109), Olweus (1997, p.170-190) e Moraes
& Silva (2000, p.69-71), destacam que:
• Estatísticas da União Européia mostram
que 8% de todos os trabalhadores (12 milhões, de 147 milhões) sofrem
humilhações por parte de chefes e colegas de trabalho;
• Estima-se que entre 10% a 15% dos
suicídios, na Suécia, sejam decorrentes do assédio moral;
• Segundo a Organização Internacional do
Trabalho (OIT), é um dos principais fatores de aposentadoria precoce;
• As empresas nacionais de médio porte e
escoradas em estruturas familiares são as que costumam apresentar o maior
índice de chefes perversos por metro quadrado;
• Na Noruega, aproximadamente 9% de
crianças de primeira à nona série são submetidas ao assédio moral.
Em 2001, a psicóloga francesa Marie-France
Hirigoyen obteve as seguintes conclusões em sua pesquisa (EICHENBERG, 2002,
p.14-15):
• Há mais vítimas mulheres do que homens,
70% a 30%;
• Os setores mais atingidos são as
administrações públicas (nas quais não se pode demitir facilmente), o comércio
e o ensino. Interessante notar que há mais assédio moral nos contextos onde há
rivalidades e poder em jogo, como, por exemplo, nas associações humanitárias ou
caritativas;
• As áreas em que há mais assédio são
gestão, contabilidade e funções administrativas (46% dos casos);
• A média de idade das vítimas é 48 anos
(8% têm entre 26 a 35 anos, 43% têm de 46 a 55 anos e 19% têm mais de 56 anos);
• Os métodos mais utilizados são manobras
de isolamento e recusa de comunicação (58%), que podem ser combinados com
ataques à dignidade (56%) e às condições de trabalho (53%) e com violência
verbal, física ou sexual (31%);
• O chefe é responsável por 58% dos casos
de assédio moral. Um grupo de chefes e colegas, por 29%. Só os colegas, por
12%. E os subordinados, por apenas 1%;
• A duração do assédio é de três anos em
média. Entre as pessoas que responderam ao questionário, 73% estavam suspensas
do trabalho por ordem médica e 37% deixaram o emprego (20% foram demitidas por
falta; em 9% dos casos a saída foi negociada; 7% demitiram-se; e 1% foi
colocada em pré-aposentadoria).
Sobretudo, a empresa precisa criar medidas
preventivas de gestão de recursos humanos para coibir o assédio moral, porque o
processo de perversão, além de se constituir em uma afronta às normas sociais,
deve ser examinado como um sinal de alerta quanto à personalidade e à racionalidade
fria do agressor, combinadas com as suas habilidades em desenvolver um
comportamento predatório que acaba com as defesas físicas da vítima, deixando
marcas terríveis e seqüelas irreversíveis na sua integridade psíquica que,
muitas vezes, minam as possibilidades de ter sua vida de volta ou a chance de
um novo recomeço. De acordo com os resultados da pesquisa de Yokoyama (2005,
p.114):
[...] não é a competitividade que torna as
pessoas perversas, a perversão é inerente à própria natureza humana. Não é o
instinto de sobrevivência que torna as pessoas capazes de se deixar persuadir e
de abandonar seus próprios referenciais, aderindo ao grupo mais forte, mas o
prazer de ver o sofrimento alheio.
Ademais, em muitos casos, os reflexos
negativos do assédio moral na administração da organização tornam-se fator
determinante de seu fracasso, uma vez que os assediados, geralmente, são
pessoas que realmente têm talento e causam inveja (YOKOYAMA, 2005, p.21).
CONCLUSÃO
Acredita-se que este artigo mostrou a
importância fundamental na promoção de um trabalho de prevenção e
conscientização sobre o potencial destrutivo do assédio moral, para acabar com
a cumplicidade e tolerância com o indivíduo perverso e neutralizar a disseminação
desse psico terrorismo, inibindo os contextos propícios à sua ocorrência e as
suas conseqüências nos custos sociais e econômicos, uma vez que a produtividade
está diretamente ligada a um ambiente sadio, onde a cooperação e a
solidariedade são fundamentais.
Outrossim, procurou-se mostrar que, apesar
da visão financeira ainda prevalecer, em detrimento de uma perspectiva mais
ampla de gestão empresarial, as empresas não conseguem sobreviver somente com a
superioridade tecnológica, uma vez que, como diz Cavalcanti (2004, p.58): “no
final de tudo, são as pessoas que movem a organização, também são as que
coletam, filtram, interpretam, disseminam os dados, as informações, o
conhecimento e a inteligência”, ou seja, as pessoas não podem ser encaradas como
objetos descartáveis.
AUTORES:
YOKOYAMA, Neide
SAKURAI, Vanessa Fuku
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